A controladora de elite Loreen Willenberg

Por Beto Volpe

O HIV entrou em minha vida nos idos de 1989, quando a morte me mostrou sua cara. Também foi nesse ano que o muro de Berlim caiu, como também caiu a arrogância do Partido Comunista Chinês ante o ‘rebelde desconhecido’, que se postou diante de um tanque de guerra em plena Praça da Paz Celestial. E neste ano de 2020, ano em que o mundo vive uma epidemia que colocou todo mundo no ‘grupo de risco’, uma mulher pertencente ao grupo de controladores de elite, que apresentam carga viral indetectável e bons níveis de CD4 sem necessidade de tratamento, apresentou cura espontânea, tendo eliminado o vírus de seu corpo sem a necessidade de nenhuma intervenção.

A cura está próxima. No fundo, no fundo, quem está nessa toada há bastante tempo já tinha essa percepção. Passou pela pior das provações em saúde, que é ter uma doença fatal e sem tratamento, viu a descoberta do coquetel que deu a falsa sensação de cura ou de controle sobre a epidemia e viu os efeitos colaterais migrarem de enjoos para cânceres, de azia para necrose óssea, gerando uma mortalidade invisível maior que o número de óbitos por AIDS que, diga-se de passagem, ainda não tem efetiva atenção por parte dos governantes. Mas também viu o meio científico desconfortável perante a crescente complexidade em seu acompanhamento clínico, forçando-os a retomar as pesquisas para a cura. Também os investidores retomaram seus financiamentos e o resultado é que passamos a ver também vários trabalhos relacionados sendo apresentados em congressos e conferências mundo afora.

Novas tecnologias foram incorporadas na luta, quebrando o monopólio dos laboratórios. Células-tronco, engenharia genética, bionanotecnologia... A Era de Aquário se precipitando junto a revolução da comunicação, trazendo o admirável mundo novo tão sonhado no século 20. E veio o primeiro caso, o do ‘paciente de Berlin’, onde uma rara combinação de fatores em um transplante de medula possibilitou a erradicação do vírus em seu corpo. Muita vibração, afinal foi comprovado que seria possível matar o HIV, sujeito pra lá de escorregadio, mas ainda era pouco para se falar que havia sido descoberta a cura da AIDS. Então apareceu o ‘paciente de Londres’, também fruto de transplante de medula e o ‘paciente de São Paulo’, que está em fase final de avaliação de resultados, mas que é um senhor avanço, sem dúvida. E agora aparece a paciente americana que eliminou o vírus de seu organismo de forma espontânea.

Enfim, a cara da morte ganhou uma companheira: a cara da cura. O fim de um pesadelo de mais de 30 anos agora é uma realidade possível e tem muita gente se empenhando em nos acordar desse sonho sombrio, com tantas perdas humanas e materiais. Que tanto sofrimento tem trazido a pessoas, famílias e amigos. Que tanta dor de cabeça tem dado a gestores em saúde e tanto trabalho aos cientistas e médicos. Resta a nós, que vivemos com HIV, redobrar os cuidados com a saúde e manter a fé, porque a cura é questão de tempo. E, ao que tudo indica, pouco.

 

Se Cazuza ainda estivesse por aqui, diria: eu vi a cara da cura e ela estava viva!
Viva a Vida!!!

“Carga Viral”, por Beto Volpe
Beto Volpe é ativista em Direitos Humanos, escritor, autor do livro "Morte e Vida PositHIVa" e colunista sobre HIV/AIDS em Saúde Pulsando


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