Recife se antecipa e aplica reforço; MS volta atrás e libera D3 de vacina da covid-19

O Secretário da RNP+ recebe a D3 no Recife. Foto: Arquivo Pessoal.

Uma em cada quatro PVHA relata problemas para acessar D1 e D2; D3 não tem aplicação definida em SP

Por Paulo Giacomini

Como antecipamos, o Ministério da Saúde (MS), por meio da Secretaria Especial de Enfrentamento à Covid (Secovid), publicou nova Nota Técnica que retifica documento anterior. Neste, todas as pessoas vivendo com HIV/aids (PVHA) são elegíveis à aplicação da dose de reforço – chamada D3.

Antes mesmo do MS retificar sua nota técnica, a capital pernambucana já havia começado a aplicar o reforço da vacinação das PVHA. Na foto, o secretário de articulação política da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV e AIDS – RNP+, Jair Brandão, recebendo a D3 no sábado (18), em um drive thru montado no estacionamento de um supermercado de Recife.

Pelo Brasil
Assim como na Veneza brasileira, o município de Araraquara, no interior de São Paulo, anunciou na segunda-feira (20) – mesmo dia em que a nota retificadora foi assinada – que iniciaria imediatamente a aplicação da D3 em todas as PVHA.

Na capital fluminense, há a informação que o município teria encontrado problemas na nota técnica retificadora e, segundo o que Renê Junior, do Grupo Pela Vidda, escreveu no perfil de Saúde Pulsando no Instagram, “isso ainda não funciona porque segundo a Secretaria Municipal de Saúde a nota técnica saiu com erros de digitação e não pode ser ainda considerada como definitiva. Ainda está valendo a questão do CD4”.

Conforme escreveu em seguida, “a coordenadora do PMI [Programa Municipal de Imunização] disse na reunião do Conselho [Municipal de Saúde]. Ela informou que fez consulta ao Ministério e o próprio Ministério disse pra desconsiderar a nota técnica por causa de erro de digitação. E que aguardasse ser publicada a nova nota técnica já corrigida. Enquanto isso vale a regra antiga do CD4”. Segundo Renê afirmou, a informação está registrada em ata do órgão de controle social das políticas públicas em saúde. Saúde Pulsando não encontrou erros de digitação na Nota Técnica 43/2021.

Em São Paulo, durante reunião do Fórum de Dirigentes, evento anual no qual o programa de controle das IST/aids no estado reúne as coordenações de IST/aids dos 145 – definidos por número de casos e por abranger cerca de 98% das notificações, entre outros critérios – municípios prioritários para o controle da epidemia, a Dra. Rosa Alencar, da coordenação técnica, informou que “o programa estadual de imunizações nos pediu uns dias para resolver sua operacionalização”. Segundo disse, não há disponibilidade imediata de vacinas, pois não havia esta previsão.

Foi a coordenação de IST/aids paulista que, por ofício, disse ao MS que o CD4 não fazia parte da rotina no tratamento das PVHA. Talvez, alguém não tenha sido informado no meio do caminho, mas o fato é que as vacinas são entregues aos municípios, que fazem a distribuição local. É o município que fornece as vacinas aos equipamentos de saúde onde a população será vacinada.

D1, D2: a vacinação das PVHA
Assim que divulgado o calendário e iniciada a vacinação, Saúde Pulsando elaborou questionário para captar a percepção das PVHA sobre todo o processo. Em um formulário online, o levantamento reuniu as informações fornecidas por usuárias e usuários das mídias sociais e grupos nos quais foi divulgado.

Entre xs internautas respondentes, 25% declaram-se do sexo feminino, 73,5% masculino e 1,5% de outros sexos; 21% não residem nas capitais brasileiras e 2% não pretendiam tomar a vacina contra a covid-19.

“Não vacinei ainda. Complicado. Pra ter acesso você precisava revelar sua sorologia no PSF [Programa de Saúde da Família] do bairro. Cidade pequena, sabe como é... vou esperar a idade!”, relatou internauta respondente.

O dado que chama a atenção é que 26% responderam ter encontrado dificuldades para tomar as doses 1 e 2. Estas, foram: exposição, quebra de sigilo sorológico, exigência de laudo médico. Além disso, 21% tiveram que disponibilizar cópia do documento que atestava a condição de imunossupressão.

“Na primeira dose da vacina retiveram o meu laudo médico. Ao tomar a segunda dose perguntaram em qual faixa [etária] eu me encaixava. Tive que falar que era portadora do HIV", relatou uma respondente. “Falta de assistência social adequada e humanizada em relação às comorbidades. Falta de organização e treinamento adequado às pessoas com HIV e o direito ao sigilo médico”, escreveu um(a) internauta respondente.

Das PVHA vacinadas, apenas 12 receberam suas doses em um serviço de referência em IST/aids. A maioria – 64% – foi vacinada em ponto de vacinação ou drive thru, 21% receberam suas doses em postos de saúde e 3% em outros locais.

“No meu município foi difícil, somente após uma vereadora tomar as dores e abrir uma reclamação na Câmara que a secretaria de saúde passou a nos aceitar para vacinação. Até então nem no SAE [serviço de atendimento especializado] sabia nos informar nada... muita desinformação rolando, uma pena né?”

Em outro relato, respondente diz: “no posto onde devo tomar a vacina eles fazem uma fila do lado de fora e um técnico vai verificando se você trouxe os documentos necessários. Porém, tudo isso ocorre sem respeitar a privacidade, ali mesmo você tem que falar a sua comorbidade em alto e bom som e acaba que outros da fila ouvem.

Outrx respondente, que parece ser profissional de saúde, corrobora com o comentário anterior. “É extremamente desgastante e constrangedor. A sua comorbidade é exposta pra todos na hora que te perguntam, é um pouco de despreparo já que hipertensão e diabetes é normal, mas HIV é coisa de outro mundo. Eles não estão preparados pra te vacinar com sua ‘condição’. Faço os lançamentos das vacinas e fico muito incomodado quando descubro alguém vivendo na mesma condição que a minha e a maioria opta por se vacinar nos centros de tratamento.”

Ouro respondente escreveu que “para a vacinação, passei por 3 ‘barreiras’ de profissionais de saúde. Todos pediram os documentos e laudos. Antes de ser vacinado, a enfermeira perguntou em voz alta a comorbidade. Não havia ninguém na sala. Achei desnecessário perguntar isso, pois isso já estava na documentação. A impressão foi que ela não acreditou que era uma pessoa vivendo [com HIV/aids]”.

As PVHA receberam, em sua expressiva maioria – 64% –, a vacina da Astra Zeneca, 6% foram imunizadas com as doses da Pfizer e 4,5% com doses da Coronavac.

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