Rafaela Queiroz: ativista de TV chega aos 30

Por Rafaela Queiroz

Dei uma sumida, talvez ninguém tenha percebido! O sumiço não foi algo visto nas redes já que compromissos continuaram sendo cumpridos e quase sempre não há uma compreensão dessa necessidade de “casulo”. Após escrever sobre o Dia das Mães, eu sabia que logo chegariam datas que mexem com meu emocional; todo ano eu costumo ficar mais introspectiva, reflexiva e um tanto improdutiva.

Escrever sempre foi uma das minhas “armas” para sobreviver, mas nem sempre escrever me faz expressar o que estou sentindo, até porque há sentimentos que não são possíveis descrevê-los, apenas sinto e sinto muito! Logo que passa o dia das mães, vem o mês do dia dos namorados, depois o dia dos pais, meu aniversário e dia da morte do meu pai sanguíneo... é um grande “BOOM” de sensações que ecoam dentro do peito.

Dia dos namorados remete à velha sensação de solidão! Eu e uma amiga também vivendo com HIV já falamos algumas vezes sobre essa solidão, que se intensifica bastante quando assumimos a sorologia pública. O estigma social também afeta nossas possibilidades de relações e afeta as pessoas que vamos nos relacionar, como vocês devem questionar. Para algumas pessoas “segurar” o peso social de namorar alguém que fala do HIV ainda é “pesado”, há perguntas estigmatizantes e dúvidas arcaicas que não se perguntam, apenas acontece o afastamento social. Uma fez já ouvi de uma pessoa que estava conversando pela internet que ela não tinha preconceito por eu ter HIV, mas para que eu falava abertamente sobre isso? Para ela ninguém precisava saber! Mal ela sabia que após eu falar sobre viver com HIV publicamente muitas coisas mudaram, inclusive a dificuldade de iniciar conversas com finalidade de me envolver de forma afetiva e emocional... falar sobre isso gera outro textão, que qualquer dia trago aqui para vocês!

Bem, passado o dia dos namorados vem chegando o mês do meu aniversário – AGOSTO – que é uma intensidade de todo e qualquer sentimento que vocês possam imaginar serem capazes de sentir... é nesse mês que eu penso muito sobre minha existência no mundo, sobre meus planos, sobre meus sonhos e sobre VIDA. E ao pensar em VIDA eu penso também em morte, em partidas... nesse pensar eu falo de sentir também, ao mesmo tempo que agradeço ao universo por estar viva eu me questiono por que meus pais não; brigo emocionalmente com alguém lá em cima ou de algum universo paralelo que resolveu mexer com o que seria minha base. Este ano eu então faria 30; bem, faz alguns poucos dias que completei 30 anos! MEU DEUS, EU ESTOU VIVA! Quando penso em tudo que passei, no todo que fui capaz de ressignificar penso: C.....RACAAAAAA! EU FUI CAPAZ!

Conseguir chegar aos 30, sem nenhuma internação, sem nenhuma doença oportunista grave, sem problemas de saúde é um tanto RARO para quem nasceu com HIV! Bem provável que poucas pessoas compreendam isso, a histórias de jovens... ops adultas (?) como a minha são contadas de outra forma. Tenho colegEs, amiguEs como eu, de TV (Transmissão Vertical), que têm uma longa fase da vida vivenciada em rotinas de idas e vindas de internação, de constantes doenças oportunistas e afins. Isso me faz entender e enxergar que eu não sou EXEMPLO para ninguém, eu não sou GUERREIRA, eu sou eu, com minha singularidade, meus privilégios de ter podido viver uma vida com meus pais (tios sanguíneos) que escolheram me adotar com todo afeto, todo amor que há! Nós, minha irmã e eu, fomos e somos tratadas da mesma forma, somos amadas como filhas! Meus pais raramente se referem a nossa adoção com as pessoas, quando alguém lê ou descobre a adoção ficam espantados! Aprendam uma coisa, não se refiram a filhos adotivos como “filhos adotivos”, são filhos apenas ok!

Bom, o texto está ficando enorme e eu nem escrevi metade do que foi esse “sumiço”, mas eu gostaria de compartilhar com vocês que nesses 30 anos eu FLORESCI e isso levou vários ciclos, passei por várias fases, horas boas horas ruins... no post que fiz no meu facebook eu falo um pouco sobre essas mudanças, que não foram só físicas, deixo aqui caso queiram saber mais.

É isso Amores, obrigada por me acompanharem e lerem um pouco do que consigo ir compartilhando com vocês! Até a próxima...

“Rebeldes na Luta”, por Rafaela Queiroz
Rafaela Queiroz é psicóloga, pós-graduanda em psicopedagogia e ativista pelos Direitos Humanos e HIV/aids.


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