Arquivo pessoal
Hoje a macaquita acordou cansada, coitada. Tanto, que deitou depois do almoço, pôs o despertador pra acordar e tomar um banho antes de uma reunião remota às 16h. O relógio tocou e a macaquita bateu no relógio e continuou a dormir. Acordou às 17h25.
E aí, entrei na onda da macaquita e decretei folga pra equipe do Saúde Pulsando. Ops, pra euquipe.
Até porque a entrevista com o sanitarista e epidemiologista Draurio Barreira merecia ficar um dia inteiro na manchete. Assessor sênior para tuberculose do Unitaid e ex-coordenador do Programa Nacional de Controle da Tuberculose do Ministério da Saúde, ele faz o que todo repórter espera de seu interlocutor-entrevistado: que diga tudo o que precisa dizer, sem pudores.
Obviamente que o médico tem seus pudores. Todos nós os temos. Mas a entrevista contempla o atual momento que a pandemia de Covid-19 impôs sobre o Brasil negacionista. E que está impondo e vai impor ainda mais – sempre silenciosamente – também sobre a realidade da tuberculose no País.
Uma entrevista não é uma pesquisa, que recolhe dados e os analisa para mostrar um retrato da realidade. Uma entrevista é a expressão de um ponto de vista de um determinado recorte da realidade. Assim, apenas por sua atualidade – além da sinceridade com que o entrevistado discorre sobre os tópicos abordados em perguntas – já merecia o destaque.
Considero, no entanto, um outro ponto: o da produção de um material especialmente para leitorxs de Saúde Pulsando. Este, pra mim, é fundamental, enquanto jornalista. E pra atazanada macaquita, enquanto “dona da porra toda”.
De que adianta para Saúde Pulsando, enquanto veículo de comunicação iniciante, que precisa mostrar que merece o crédito a cada linha que publica, publicar uma reportagem sobre a devastação da Covid-19 no mundo aliada a tuberculose com a voz de meia dúzia de médicos e nenhum médico brasileiro? De que adianta publicar uma coluna de opinião escrita na primeira pessoa e extirpar o nome de seu autor?
A nomeação do novo secretário de vigilância em saúde do governo Bolsonaro estava em todos os sites. Mas não esteve em Saúde Pulsando. Devia estar, já que HIV/aids, hepatites e tuberculose estão alocados na vigilância em saúde. Mas todos os outros veículos deram. A notícia deixa de ser relevante mesmo para um veículo extremamente segmentado, porque toda a mídia deu. Se toda a mídia deu, é de interesse geral, não tem segmentação. Pode até valer como registro do veículo.
Esta semana fizemos – eu, a macaquita, o Saúde Pulsando, a Elisiane Pasini e o Flavio Lenz – um trabalho realizador.
Faz 38 anos que em todo 5 de junho é lembrado o dia em que o CDC trouxe ao mundo o que se tornou a GRID (doença relacionada a infecções de gays) um ano depois: AIDS. Não me lembro de nenhum veículo de comunicação ter trazido o reporte semanal do CDC em sua íntegra. Os termos “câncer” e “peste” gay com os quais a aids era relacionada no início da epidemia começaram nos periódicos científicos, eu costumava dizer. Na verdade, foram assimilados pela ciência porque em 5 de junho de 1981, em nota editorial, o reporte semanal do CDC diz mais ou menos isso: uma doença que tem alguma coisa a ver com o modo de vida gay. Também não me lembro de nenhum veículo dizer isso tão claramente. Saúde Pulsando diz. O sarcasmo não passou do título, afinal, todos temos pudores.
Saúde Pulsando não está completamente inserido no establishment da mídia especializada no Brasil. Porque é novo, ainda engatinha. Mas dá voz às prostitutas, dá voz às transexuais, às pessoas vivendo com HIV e aids. Põe um holofote sobre a tuberculose e sobre as hepatites virais. Separa esta macaquita – que aqui faz uma espécie de diário de bordo misturado com terapia em grupo, quem diria?! – da opinião do veículo – que deve estar somente na emergência. Que produz entrevistas inéditas e lives politizadas; que em pouco mais de 40 dias já falou mais de quatro vezes sobre licenciamento compulsório.
Press-release é um comunicado para a imprensa; geralmente, uma sugestão de pauta. Em Saúde Pulsando é exatamente isso, uma sugestão de pauta para ser apurada, recontada, jamais pra ser apenas reproduzida. Produzida é o que uma pauta deve ser. Como a gente aprende na faculdade.
“Diário da Macaquita”, por Paulo Giacomini
Jornalista, começou criando o jornal da empresa em que trabalhava. Da faculdade foi direto pra Coluna Gay da Revista da Folha, da Folha de S.Paulo, onde colaborou com Poder, Esporte, Turismo e Ilustrada. Trabalhou na G Magazine, fez cobertura de carnaval pra Coluna do Gugu e ajudou a criar OFuxico. No movimento de aids, escreveu, editou, fotografou, produziu e deu forma a diversas publicações. Fez especialização e mestrado em Informação e Comunicação em Saúde no Icict/Fiocruz e foi Secretário de Informação e Comunicação da RNP+BRASIL. Vive com HIV/AIDS desde 1984. É diretor de Saúde Pulsando.
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