Transexual dorme na rua (Foto: Arquivo Pessoal)

8M tudo cabe. Só não cabe a hipocrisia

Num dia simbólico como hoje, cabem simbologias.
Num dia simbólico como hoje, cabem celebrações.
Num dia simbólico como hoje, cabem elogios, homenagens.
Num dia simbólico como hoje, cabem críticas, denúncias.
Num dia simbólico como hoje, cabem fé e esperanças.
Num dia simbólico como hoje, cabe AMOR.

Cabe também a minha homenagem a Todas as Mulheres e o meu reconhecimento à força, coragem, luta e resiliência das Mulheres Trans e das Mulheres que Vivem com HIV e AIDS.

Também me cabe apresentar aqui nesta coluna do Saúde Pulsando, o lindo, direto e verdadeiro texto de nossa companheira Ivone Correia, do Rio de Janeiro. Uma mulher trans que já passa dos 70 anos, emblemática e que constrói diariamente e se mantém resiliente e resistente até hoje, como todas nós.

Jacque Côrtes

 

Mulheres Transexuais em situação de alta complexidade habitacional

Por Ivone Correia

Por estarmos comemorando o Dia Internacional da Mulher, o 08 de Março, que trago à pauta uma problemática que é constantemente invisibilizada por outros setores femininos universais, e a qual me refiro: a situação da alta complexidade vivenciada no âmbito habitacional da atualidade pela população transexual feminina jovem e desprovida de apoio de seus núcleos familiares e de trabalho em nosso querido Brasil.

E no que tange a essa problemática da dificuldade em encontrar uma moradia e por sua vez ao grau de vulnerabilização que se encontram muheres trans, desejamos, por meio dessa breve prosa, dizer em alto e bom tom que o sistema neoliberal e ainda supostamente marxista (sistema de exploração da classe operária pela burguesia) trata  essas mulheres transexuais jovens com um imenso desrespeito as suas condições humanas de ser e estar no mundo, cerceando-as de seus direitos de ir e vir, de comprar e vender, ou mesmo de radicar-se em um lugar se essa for a sua vontade. Sim, sistema neoliberal, iniciado no Brasil com o governo de Fernando Collor de Mello e consolidado com a chegada de Fernando Henrique Cardoso à presidência. Como consequência desse sistema que privilegia a classe dominante (empresários e burgueses) em detrimento do desenvolvimento econômico social, com justa distribuição de renda, podemos observar forte redução de investimentos públicos em setores básicos como saúde pública, educação, segurança, moradia e trabalho, e crescente privatização de empresas estatais, desta forma, refletindo negativamente no bem-estar social.

Negar o direito de locar um imóvel neste país simplesmente por se tratarem de mulheres transexuais é uma postura cruel e transfóbica do mercado, o que acaba obrigando muitas mulheres trans e travestis a buscarem auxílio em abrigamentos e acolhimentos institucionais, perdendo aí suas autoestimas e liberdades sociais. Sem contar que com a ausência do poder público, essas casas abrigo estão cada vez mais escassas no país, sobrevivendo dos esforços comunitários, incluindo ONGs e instituições religiosas e de algumas pouquíssimas empresas do setor privado que demonstram algum trabalho com base na responsabilidade social.

O que desejamos em realidade nesse desabafo é sinalizar aos interessados/as e parceiros/as sobre a situação inaceitável em que se encontram mulheres transexuais e travestis em situação de alta complexidade habitacional, em situação de rua muitas vezes, pois essas mulheres advindas de várias regiões tupiniquins não encontram alentos adequados nas grandes metrópoles no sentido de moradias dignas, trabalho e segurança, saúde e educação. Aqui trazemos a questão da migração intra e inter país. Mulheres Trans que saem de suas terras natais na busca de paz e oportunidades. Contudo proferimos que nesse “08 de março de 2021” - ano da pandemia Covid 19” -  uma nova porta possa se abrir para que nossos direitos sociais, individuais, difusos e políticos como mulheres transexuais sejam outorgados e respeitados.

Defender a estatização de empresas em setores estratégicos, a criação de serviços públicos gratuitos e de qualidade, interferir na economia impedindo monopólios, contribuir para a geração e distribuição de renda, são ações políticas necessárias para que este cenário aqui descrito deixe de existir. Somente desta forma vamos combater as desigualdades sociais e promover um Estado de bem-estar social.

Moradia Já! Respeito Sempre!
08 de Março, Dia Internacional de Todas as Mulheres!

(*) Ivone Correia é ativista do Instituto Nacional de Mulheres Redesignadas (INAMUR), no Rio de Janeiro (RJ)
Artigo em escrito com a colaboração de Jacqueline Rocha Côrtes, INAMUR, Campinas (SP).

 

“TransitHIVa no Ar”, por Jacqueline Rocha Côrtes
Jacqueline Rocha Côrtes é uma mulher de 60 anos, idosa (risos), professora aposentada, casada, mãe, esposa, irmã, filha, amiga, companheira, colega, ativista, alegre, triste, fraca, forte, brincalhona, séria, destemida, disponível e solícita, impaciente, suave e firme, decidida, compreensiva, e brava. Bem-sucedida em meus sonhos e desejos, sofrida, pisada, humilhada, agredida, respeitada, acalentada, desejada, querida, acarinhada e amada. Muito amada. Agradecida e grata. Sou uma mulher, e dentre estas características minhas, também sou uma transexual redesignada e vivo com HIV e AIDS há 26 anos! E tenho um filme documentário, longa-metragem, que conta a história da minha vida. ‘MEU NOME É JACQUE’. Tá, meu bem?


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